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Sacroileíte? Vou ali ao bloco e já volto.

  • Foto do escritor: Susana Meneses
    Susana Meneses
  • 11 de mar. de 2018
  • 5 min de leitura

Atualizado: 16 de abr. de 2018


Pela complexidade do meu problema de saúde, avançou-se com uma discussão em gabinete sobre o meu caso clínico. Os intervenientes eram o especialista em medicina desportiva, o meu reabilitador, um ortopedista a quem foi pedida uma opinião e eu. Em cima da mesa estava a possibilidade do diagnóstico ser uma sacroileíte, uma patologia muitas vezes negligenciada como causa da dor lombar.


Mais uma vez a minha história clínica foi ouvida detalhadamente. Foram efetuados uma série de testes provocatórios que são usados para ajudar a elucidar se a articulação sacroilíaca pode ser uma causa contributiva ou isolada da dor lombar. Segundo a literatura, é necessário que pelo menos três desses testes sejam positivos para que o diagnóstico seja confirmado. E foi o que aconteceu. Em mais de três deles senti exatamente a dor que me acompanhava há meses na articulação sacroilíaca e na região lombar esquerdas.


A probabilidade de ser uma sacroileíte aumentou consideravelmente. Ainda sem exames complementares de diagnóstico que a confirmassem, foi-me proposta fazer uma infiltração diagnóstica na articulação e aceitei. A infiltração consistia na injeção de um anestésico e de um corticóide intra-articular. O resultado esperado seria um de dois: ou ficaria sem dor e a disfunção da articulação sacroilíaca estava confirmada ou continuaria com dor. E o resultado foi o tão desejado. A dor desapareceu em poucos minutos. Fui feliz durante o resto do dia mas o acordar no dia seguinte foi igual a tantos outros.


Embora o exame clínico possa revelar-se impreciso, a imagem também assim é. A ressonância magnética pode, no entanto, ser uma ferramenta valiosa para ajudar a excluir outras patologias. O passo seguinte estava ao alcance desse exame e da observação por neurocirurgia com todos os tempos de espera a que tive direito.


A ressonância não revelou alterações mas também já estava elucidada para essa possibilidade. Fui observada por neurocirurgia e o plano traçou-se ali: avançar com a redução/eliminação da dor por radiofrequência. Muito resumidamente, sem grandes termos técnicos, consiste numa técnica minimamente invasiva que envolve a inserção de elétrodos (agulhas) que aplicarão uma corrente elétrica de ondas de rádio, de modo a provocar uma lesão nos ramos nervosos responsáveis pela dor. Este tratamento tem um efeito seletivo sobre as fibras nervosas, pelo que inibirá a dor mas deixará intacta a capacidade sensorial.


A causa não seria tratada com este procedimento mas era esperado que a dor fosse reduzida no mínimo em 50% e muito sinceramente, eu já não queria saber do diagnóstico. A única coisa que me interessava era que me tirassem a dor.


Quinta-feira, dia 14 de Setembro de 2017: o tão desejado dia tinha chegado. Finalmente ia dar um passo gigante na minha recuperação. Treze meses de dor. A ablação por radiofrequência da articulação sacroilíaca esquerda ia acontecer. Não nego que tive receio que não desse certo. Todas as experiências pelas quais tinha passado no último ano fizeram com que criasse inconscientemente barreiras, desconfianças e incertezas. Naturalmente tornaram-me menos vulnerável do ponto de vista emocional e mais segura do que quero para mim e das decisões que tomo.


Apresentei-me às 13:30 no Hospital da Luz de Lisboa e a partir daí começou a contagem decrescente para ir ao bloco. Sem rodeios o que me ocorria naquele momento era: “só acredito que isto está a acontecer quando estiver deitada de rabo para o ar na marquesa cirúrgica, na sala do bloco operatório”. Só nesse cenário é que eu achava que poderia respirar de alívio, com a certeza que ia acontecer de verdade. Nunca houve espaço para temer tudo o que envolvia o procedimento, desde a sedação, as agulhas enormes, as temperaturas elevadas a que ia ser submetida, nem tão pouco a mínima percentagem de ocorrer alguma complicação.


Todos os passinhos nesta luta foram dados sempre lado a lado com o meu companheiro de batalha, meu namorado, meu melhor amigo, meu conselheiro, meu tudo. Ele viveu como ninguém consegue imaginar as minhas limitações, as minhas recaídas, os meus desabafos, a minha vontade de desistir e de acabar com o sofrimento. Foi ele que esteve sempre lá tanto de um jeito meio bruto a chamar-me à razão, a motivar-me, a obrigar-me a levantar e a continuar a lutar, como era também ele que me mimava com aquele abraço imenso e me fazia sentir a mulher mais especial do mundo. E por tudo isto e muito mais, a palavra “desistir” deixou de existir no meu vocabulário. Esta batalha deixou de ser minha e passou a ser nossa.


E a minha ida ao bloco não foi exceção. E é um sorriso que esboço nos lábios quando recordo ele a gritar lá no fundo do corredor da enfermaria “É NOIS”, “VAI DAR TUDO CERTO”, enquanto a senhora auxiliar me transportava na cama até ao bloco.


O mundo é mesmo pequeno e o da enfermagem não foge à regra. E qual não foi o meu espanto quando, já no bloco, encontro duas caras conhecidas (a de um enfermeiro e de uma auxiliar com os quais trabalho e trabalhei) no meio de tanta gente de barrete colorido que ia passando atarefada de um lado para o outro. Tão improvável como o facto de estarem de serviço na sala onde a minha cirurgia ia acontecer. E como foi tão terna, tão verdadeira e tão espontânea a reação deles ao verem-me…


A sedação foi administrada e o “apagão” deu-se até despertar já no recobro. A radiofrequência é um procedimento realizado com anestesia local e com uma duração média de 30-45 minutos e completamente indolor. No meu caso foi realizada ablação dos nervos mediais de L4 e L5 e ramos posteriores de S1 e S2 esquerdos. O tempo de recobro foi aproximadamente de 30 minutos e pouco depois retomei à enfermaria devidamente acompanhada por uma enfermeira e uma auxiliar. Iniciei dieta que tolerei e logo de seguida já acompanhada pelo meu namorado, fiz levante, vesti-me autonomamente e tive alta saindo pelo meu próprio pé sem dor e com total amplitude de movimentos.


Confesso que foi muito estranho aquele primeiro impacto com a má postura que havia adquirido durante um ano a defender-me da dor. Um bom exemplo disso foi logo o primeiro desafio: entrar no carro. A forma como entrei no carro pensada ao detalhe, tendo em conta pormenores como a posição dos pés, a angulação dos joelhos, a rotação das costas, a flexão do pescoço, nesse momento revelou-se absurda. Eu já não sentia dor. Qual o porquê de um “sentar” tão tenso? O cérebro é soberano e num ano adaptou-se a tantas compensações músculo-esqueléticas comandando o corpo de forma a defendê-lo da dor.


As primeiras 24 horas de pós-operatório foram muito satisfatórias. O acordar do dia seguinte foi o melhor de sempre no último ano. Mas ao segundo dia após o procedimento a dor voltou com a mesma intensidade. Fui previamente avisada que os próximos dias seriam muito dolorosos e que ainda não me podia ver livre do anti-inflamatório que tomava há meses. A radiofrequência não tem um efeito imediato e estão descritos resultados favoráveis ao fim de duas a quatro semanas após o procedimento.


Já só pensava na minha reabilitação, no regresso ao trabalho e à minha vida normal que havia deixado em meados de Agosto de 2016. Sentia-me muito motivada e mais do que nunca focada nos meus objetivos, apesar da dor e de ainda depender de medicação.


Mas passou um mês e a dor manteve-se com aquela incapacidade torturante de sempre. Algo de errado se passava.

 
 
 

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