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O primeiro sinal

Agosto de 2016, mês de calor, praia, sol, boa disposição. Para mim também seria, como foi durante 27 anos, mas não passou de um mês marcado pelo início de um longo percurso pelo mundo da dor. Tudo começou com uma dor no pé esquerdo sem história de traumatismo ou queda. À primeira vista inocente. Stress, esforços, excesso de exercício físico, trabalho, tantas as razões que poderiam justificar essa dor. Nessa altura estava de férias no Norte, a acompanhar de perto os últimos dias de vida da minha avó. Todas as prioridades estavam voltadas para ela. E foi num dia, depois de ir visitá-la ao hospital, após três dias desde o início da minha dor no pé, que decidi ir ao serviço de urgência. A dor estava intolerável. Era incapaz de apoiar o pé no chão. Fiz uma radiografia, que não mostrava alterações relevantes e fui para casa medicada com anti-inflamatório e indicação para usar uma meia compressiva por se tratar de uma tendinite.  

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Ao contrário do esperado, a dor foi agravando e recorri uma vez mais ao serviço de urgência já em Lisboa. Fui observada por Ortopedia , tendo sido prescrita uma palmilha por suspeita de um Neuroma de Morton, com a indicação que teria que realizar uma ecografia ao pé.

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Entre o encaminhamento para consulta de Ortopedia até à realização da tal ecografia passaram-se duas semanas. O resultado do exame mais uma vez não confirmava o diagnóstico. Nisto, as minhas férias ( se é que posso chamá-las assim) terminaram e o regresso ao trabalho não aconteceu. Meti baixa. Não aguentava dez minutos de pé. Seria impossível aguentar doze horas a trabalhar num bloco operatório.

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Passados dois meses do início das minhas queixas, uma ressonância magnética revelou uma fratura de stress do segundo metatarso do pé esquerdo. A imobilização do pé já não fazia qualquer sentido uma vez que o calo ósseo já estava formado e foi nesta altura que surgiram as dores nas costas do lado esquerdo. Mas quem não as tem? Essa dor foi atribuída ao facto de ter apoiado o pé à defesa durante dois meses. Tudo levaria a crer que quando voltasse à minha passada normal, as dores desapareciam. Esta foi a visão do médico que me acompanhava.

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O regresso ao trabalho surgiu ao fim de 3 meses infernais em casa, com o pesadelo diário de ter perdido a minha avó (a velhota mais à frente do seu tempo que alguma vez existiu), sem poder fazer o que mais gostava, sem poder treinar, passear, trabalhar, enfim… sem poder ser ativa!

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A dor lombar acompanhou-me nesse regresso ao trabalho. O sentimento de impotência, de revolta, de angústia acompanhavam as lágrimas que me escorriam pela cara a cada turno que terminava com o sentimento de missão cumprida em função dos outros e colocando os outros sempre acima dos sinais que o meu corpo me dava.

O profissional de saúde não tem direito a ter dores, a ter dias menos bons, as exigências chegam a cada minuto e se nos apresentamos fardados somos mais um igual a tantos outros.

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A dor tem essa grande desvantagem: não se vê! É sentida no corpo de quem a tem, com diferentes níveis de tolerância, mais ou menos encenada mas desvalorizada por uma boa maioria de profissionais de saúde que resumem o seu canudo à avaliação de exames.

E é numa manhã de Novembro de 2016, sete dias após o meu regresso ao trabalho, que o despertador às 06:50, anunciava mais um dia longo pela frente, mas esse acordar foi diferente de tantos outros. Acordei com a sensação que estava prisioneira do meu próprio corpo. Que rotinas simples como levantar da cama, vestir, calçar, sentar, tinham ganhado um nível de dificuldade absurdo. A dor estava tão exacerbada que dava ideia que tinha uma tábua no lugar da coluna.

Mas o compromisso de não faltar ao trabalho falou mais alto, mais uma vez. E no momento em que me apresentei fardada e confrontada com todas as tarefas que me competiam, percebi que não era capaz de as executar.

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E repetia-se o cenário! De novo de baixa. Entre admissões em serviço de urgência, análises, realização de exames desde tomografia computadorizada, ressonância magnética, eletromiografia dos membros inferiores, cintigrafia óssea, seguimento em especialidades como Medicina Interna, Reumatologia, Anestesiologia e Ortopedia, sessões de fisioterapia, listas intermináveis de medicamentos, o tão desejado diagnóstico persisita em não surgir e o tempo foi passando e a dor ficando, cada vez mais incapacitante, cada vez mais profunda.

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E o rótulo de miúda de 28 anos histérica, que não queria trabalhar, tendia a ser "colado" aos olhos de quem me ia avaliando, chegando a ouvir da boca de uma profissional de saúde, que o que eu precisava era de apoio psiquiátrico porque, no fundo, todos os exames realizados não mostravam alterações relevantes que confirmassem a minha dor. Dói muito ouvi-lo e por várias vezes me questionei se não teria razão. (Continuação no blog. Clique aqui)

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